quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

A solidariedade machista do STJ

Por Mariah Aleixo*

A sexta turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu no julgamento de um habeas corpus de um homem acusado de ter provocado sufocamento da esposa: “a aplicação da suspensão condicional do processo não resultaria no afastamento ou diminuição das medidas protetivas à mulher previstas na Lei Maria da Penha (Lei n. 11340/2006).”

O STJ aplicou suspensão condicional do processo a alguém acusado com base na Lei Maria da Penha! Mas essa lei não tinha acabado com a impunidade dos agressores? É o que pensávamos, mas não foi o entendimento do relator do processo no STJ, o ministro Celso Limongi.

A suspensão condicional do processo está prevista na Lei 9.099/95, conhecida como Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais. Os Juizados Especiais Criminais (JECRIM’s) foram criados com a competência de julgar os delitos de menor potencial ofensivo, isto é, aqueles menos graves, em que a pena é mais branda. Antes da Lei Maria da Penha, como o Brasil não tinha uma lei específica para punir e combater a violência doméstica e familiar contra mulher, e nem tampouco considerava essa conduta como crime, os agressores de mulheres eram acusados pelo crime de Lesões Corporais, podendo ter seu processo suspenso e pagando somente cestas básicas como “punição.”

Porém, o artigo 41 da Lei Maria da Penha é categórico: “Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei 9.099/95.” Desse modo, a lei de combate à violência contra a mulher, que estabelece que a pena poderá ser de um ano ou menos, afasta de uma vez por todas a possibilidade de que o agressor saia ileso e a mulher continue correndo riscos no ambiente doméstico.

Mas Limongi discorda, acredita que o artigo 89 da lei dos JECRIM’s pode ser aplicado, que diz: “Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por essa lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo....” Basta atentar para a partes grifadas e constatar que a Lei Maria da Penha é TOTALMENTE INCOPATÍVEL com a possibilidade de suspensão do processo.

Não adianta dizer, como foi feito na decisão de Limongi, que as medidas protetivas da Lei Maria da Penha não serão prejudicadas pela suspensão condicional do processo movido contra o agressor. Nós queremos a aplicação da lei na íntegra e não pela metade!

O relator do processo, o STJ e os demais juristas tem que entender que, de 2006 em diante, violência doméstica e familiar contra a mulher é CRIME. Não se pode ser benevolente. Nós precisamos não somente da proteção do Estado para o afastamento do agressor do lar, mas é necessário também o afastamento do convívio social, visto que a conduta de imprimir violência contra as mulheres é tão indesejável quanto a conduta de matar alguém, roubar, extorquir, etc.

A solidariedade machista do STJ preocupa. É preciso arejar a mente dos juristas e despi-los dos seus preconceitos de gênero. Só assim a Lei Maria da Penha terá a devida eficácia. Caso contrário, continuaremos em marcha!

Vejam o vídeo da Senadora Gleisi Hoffman, do PT do Paraná, sobre o assunto:



*Mariah Aleixo é estudante de Direito e militante da Marcha Mundial das Mulheres/PA.

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